Em Sevilha, Espanha,
Santa ÂNGELA DA CRUZ (Maria dos Anjos Guerrero González) fundadora do Instituto das Irmãs da Companhia da Cruz, que nada considerava mais seu que dos pobres, a quem costumava chamar seus «
senhores» e se dedicava verdadeiramente ao seu serviço. (1932)
Texto do livro SANTOS DE CADA DIA, da Editorial A. O. de Braga:
"Quanto a mim, Deus me livre de me gloriar a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo" (Gl 6, 14). esta frase paulina caracteriza a espiritualidade de MARIA DOS ANJOS que mais tarde toma o nome de ÂNGELA DA CRUZ.
Veio ao mundo em Sevilha, a 30 de Janeiro de 1846, de um casal pobre. Teve, por isso, ainda criança, de ir trabalhar numa sapataria. Isto não a impediu de crescer na piedade, guiada por um mestre espiritual, o cónego José Torres Padilha. Em 1865, aos 19 anos, tentou entrar nas Carmelitas de Sevilha, mas elas não a receberam devido à sua pouca saúde.
Em 1869 ingressou no noviciado das Irmãs da Caridade, mas poucos meses depois voltou para casa, devido a uma pertinente enfermidade. Foi, além disso, por esse tempo, terrivelmente provada com sofrimentos interiores em que não faltaram inclusive tentações de blasfemar. Era Deus a preparar e conduzir aquela alma para a grande obra da fundação de uma nova congregação, a Companhia da Cruz, que no fim do século XIX e nos alvores deste (XX) revolucionou o sul de Espanha com prodígios de caridade, assistindo a empestados e a toda a sorte de desprotegidos. Só a mística da cruz podia arrastar essas humildes religiosas a actos de heroísmo sobre-humanos como se colhe do caso seguinte:
"Um casal doente vive no cortiço dos Lampiões. A Madre faz um balanço dos trabalhos que lhe foram recomendados para esta semana. O Cortiço dos Lampiões, no bairro da Macarena, encontra-se nos arredores de Sevilha, num barrocal com vivendas fétidas e gente de má catadura. Os dois enfermos estão abandonados. Ninguém assoma à sua porta. «Comidinhos de bexigas» - como diz a vizinhança - não se deixam levar para o lazareto e, naturalmente, nenhum de casa entra na sua habitação, pelo contrário, fazem desvio ao passar diante da porta.
«Vamos lá saber: - duas Irmãs que se ofereçam para cuidar deles». Nestes casos todas, como de costume, levantam a mão, e começa a porfia para que a Madre lhes conceda o tesouro. A Madre escolheu a Madre Milagros.
Ao chegarem ao cortiço, as Irmãs sentiram logo o ambiente hostil daquela casa, de depararam com um quadro nauseabundo. Mas a Irmã MILAGROS está treinada.
As Irmãs abrem o embrulho com roupa lavada, depõem o manto, vestem os doentes, cuidam-lhes das chagas e arranjam a cama. Os pobres doentes, atónitos, não acreditam no que vêem. As Irmãs juntam o montão de roupa suja para ser lavada na pia, mas a governanta impede-as. Então elas, de tarde, trouxeram um grande alguidar e lavaram a roupa no meio do pátio. À noite, o quarto reluzia como um aposento de hospital.
As Irmãs põem o manto e saem ao pátio para regressar a casa. Estão chegando os homens do cortiço, após o trabalho. Um deles avança contra as freiras, proferindo blasfémias, e berra contra a governanta que as deixara entrar.
A governanta conta tudo, e todos os vizinhos se põem, a favor da Irmãs. O homem dirge-se a elas e pergunta: 'Mas dizem que não há Deus ... porque fazeis vós isto?'
A Irmã MILAGROS, que sabe onde tem os pés, responde corajosamente: «Sim, irmão, sim. Deus existe e você ofende-O, blasfemando. Por amor d'Ele também cuidaríamos de si, mas você pecou e agora tem que gritar comigo: Viva Cristo Rei!»
Noutra ocasião, procuram convencer o pároco a deslocar-se ao Cortiço:
- "Ao Cortiço dos Lampiões? Sabem as Irmãs o que aquilo é? É uma sucursal do inferno. O menos que temos a temer é que não nos recebam.".
O pároco foi, encontrou um altarzinho erguido no centro do pátio e a governanta dirigindo os últimos preparativos.
Em dez dias houve batismos, casamentos, confissões e missa de primeira comunhão. Os anciãos bexigosos, sacramentados, passaram a outra vida. O amor a Deus e,. por Deus, ao próximo tão belamente demonstrado pelas Irmãs, realizou naquelas casas uma autêntica e santa missão.
"São estas mulheres que Sôror ÂNGELA fabricou" (J. M. JAVIERRE, Sor ÂNGELA DE LA CRUZ, Escritos íntimos. Edición crítica, Madrid, 1974, pgs 124.-125)
A Serva de Deus esteve à frente do Instituto 53 anos. Em 1928 deixou o cargo, passando os últimos anos da sua vida como se fosse a última das noviças. Faleceu santamente a 2 de Março de 1932.
O Santo Padre JOÃO PAULO II, que a beatificou no dia 5 de Novembro de 1982, por ocasião da sua visita à cidade de Sevilha, sintetizou a vida dela nestes termos:
«Chamava-se ela ÂNGELA DA CRUZ, como se quisesse dizer que segundo as palavras de Cristo, tomou a sua Cruz para O seguir. A nova beata compreendeu perfeitamente esta ciência da cruz e expô-la às suas filhas com uma imagem de grande força plástica. Imagina que sobre o monte Calvário existe, junto do Senhor pregado na cruz, outra cruz da mesma altura, nem à direita, nem à esquerda, mas em frente e muito perto! Esta cruz vazia querem ocupá-la a Irmã ÂNGELA e suas Irmãs, que desejam 'ver-se crucificadas em frente do Senhor: com pobreza, desprendimento e santa humildade. Unidas ao sacrifício de Cristo, a Irmã ÂNGELA e as suas Irmãs poderão realizar o testemunho de amor aos necessitados.
De facto, a renúncia aos bens terrenos e o desapego de qualquer interesse pessoal, colocaram a Irmã ÂNGELA naquela atitude ideal de serviço, que define graficamente dizendo-se «expropriada para utilidade pública». De certo modo pertence já aos outros, como Cristo, nosso Irmão".
AAS 52 (1960) 784-7; 68 (1976) 526-30.