Em 13 de Abril de 1947 assistia Roma, interessada, à cerimónia da beatificação dum leigo da nossa época, que viveu a mesma vida que nós; e com pasmo via passar a imagem daquele cuja santidade era reconhecida pela Igreja, vestido com o trajo de cerimónia de há uns 50 anos: sobrecasaca, calça cinzenta, colarinho e gravata.
Este homem, cuja virtude soube triunfar das ciladas que, no século, de todos os lados nos espreitam, foi Contardo Ferrini, vicentino dedicadíssimo, o primeiro vicentino a conquistar a honra dos altares. Como Ozanam, professor notável, serviu-lhe a ciência admiravelmente como meio para abraçar a verdade, que em constante apostolado soube comunicar aos outros dando-lhes, com o esplendor da sua inteligência e sabedoria, a bondade inesgotável do seu grande coração, que a fé dilatava e iluminava.
Formado em Direito, na Universidade de Pavia aos 22 anos, foi sucessivamente assistente de História do Direito Romano naquele mesmo estabelecimento e professor efectivo nas Universidades de Messina e de Modena; e desde 1894 até à sua morte, ocorrida em 1902, titular da cadeira de Direito Romano novamente em Paris.
Adquiriu como professor a maior autoridade e conquistou, pelos trabalhos publicados, a admiração do mundo sábio. O grande Mommsen rendeu-lhe homenagem, afirmando que, assim como o século XIX tinha sido o século de Savigny, o século XX seria o de Ferrini: infelizmente foi arrebatado por uma morte prematura logo no limniar do século. O académico Denis Cochin, que o conheceu em Paris, escrevia a S. S. Pio X: "Ferrini, admirável crente, espalhou por toda a parte o perfume das suas virtudes; era outro Ozanam e fazia recordar tudo quanto a história refere dos servos dos séculos idos".
Ele foi efectivamente heróico nas suas virtudes, principalmente na humildade; serviu os pobres toda a vida e a Sociedade de S. Vicente de Paulo contou-o entre os seus mais valiosos irmãos vicentinos.
O Breve Apostólico lido na beatificação exalta a personalidade de Contardo Ferrini e refere com as respectivas provas os dois famosos milagres operados por seu intermédio em dois jovens curados, um do mal de Pott e outro de gravissima fractura do crânio.
Como o vicentino Pedro Jorge Frassati, como S. S. Pio XI, que considerava esse exercicio, quando não temerário, como o mais benéfico para a alma e para o corpo, foi Contardo Ferrini, apaixonado alpinista. Ao entrar no curso superior, já fizera a ascensão do Monte Rosa e durante toda a vida cultivou com paixão este desporto, que o transportava ao alto das montanhas, terrestres, donde, suspensos por uns dias os seus profundos estudos, mais facilmente se elevava até ao alto cume de Deus; e sustentava, com tantos outros, dos quais o Santo de Assis (Francisco) é exemplo máximo, que o sentimento da natureza, dom precioso das almas privilegiadas, deveria tomar uma parte importante na nossa educação, porquanto nesses contactos com a natureza, sentimos a vizinhança de Deus e contemplamos as Suas maravilhas.
E, afirmando modestamente que, se tivesse sido poeta, a inspiração teria surgido nessa hora, descreve-nos ele com encantadora poesia o espectáculo dos cumes nevados, terminando assim: "Eram precisamente esses panoramas, esses pinheiros dos Alpes, esses cumes brancos avermelhados ao sol nascente, era o brando raio da lua a brincar na noite silenciosa e a reflectir-se na superficie frisada do lago, era tudo isso que em mim acordava fortemente o sentimento religioso, a atracção para o ideal, o ódio e o desprezo por todas as fealdades".
Fica assim explicada a paixão de Ferrini pela montanha, a qual longe de contrariar, como se poderia supor, as restantes manifestações da sua vida, antes confirma inteiramente a constante ascensão daquela alma para Deus.
Milhares de vezes tomou o comando de grupos que se confiavam à sua futura experiência; mostrava-se então o mais jovial e entusiasta dos companheiros, revelando as belezas da montanha e dando explicações sobre a geologia, a fauna e a flora, à mistura com citações poéticas, em grego, em latim, em alemão ou italiano. Aconselhava também os camaradas e punha-os em guarda contra o perigo de comer certos frutos ou de beber certas águas; e dava-lhes constante bom exemplo no inflexivel cumprimento dos deveres religiosos: nunca faltou á Missa por causa duma ascensão, nem tão pouco quebrou o jejum ou a abstinência, por cansado ou fraco que se sentisse, com o que sempre edificava a todos.
Nem sempre foi, porém, tão escrupuloso na observância pessoal de cuidados de outra ordem, que aos companheiros solicitamente recomendava; e assim foi que a sua prematura morte, ocorrida em 17 de Outubro de 1902, quando tanto havia a esperar das suas virtudes e do seu talento, foi devida a uma febre tifóide, adquirida em água inquinada, que bebeu numa dessas excursões.
Nele perdeu a ciência do Direito Romano um dos fervorosos cultores e a Sociedade de S. Vicente de Paulo um dos mais ilustres ornamentos; regozija-se esta porém com a valiosa contribuiçao dada pela prática da Caridade, através da Conferência, para a conquista da posição eminente a que soube elevar-se e que lhe valeu a glória de ser proclamado pela Igreja heróico na virtude.
Foi Vice-Presidente duma Conferência de Pavia na qual introduziu o hábito da troca do beijo da paz no começo das sessões e edificou os irmãos vicentinos pela humildade de trato com os pobres aos quais visitava modestamente vestido e sobre cujas dores e virtudes meditava profundamente, para daí tirar ensinamentos para si.
LOUVADO SEJA NOSSO SENHOR JESUS CRISTO E SUA MÃE MARIA SANTÍSSIMA
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