Este importante industrial francês, que pode merecer o título de "soldado de Cristo ao serviço dos operários", foi um extraordinário realizador em matéria social, nos fins do século,passado.
Seu avô fora proprietário duma forja em Sainte Cécile, situada num ponto das Ardennes então pertencente à França, forja que em 1810 foi destruída pelos Exércitos da Revolução. Resolveu então substitui-la por uma fiação mecânica, que no fim do Primeiro Império contava já 1 200 operários; sucedeu que os tratados de 1815, transferindo esse território para a Bélgica, separaram as oficinas do seu mercado natural que era a França.
Harmel não hesitou: trouxe a fiação para França e depois da experiência de dois locais, assentou-a definitivamente em sítio encantador, logo baptizado de Val-des-Bois, junto dum afluente do Aisne na proximidade do centro lanígero de Reims. Data desta última instalação de 1841, tinha Léon Harmel doze anos; ali assistiu à edificação da fábrica e logo aprendeu a prescindir das comodidades da vida, instalando-se com a família, durante anos, num alpendre provisório.
O exemplo dos seus fez dele um sólido e indefectível cristão; quando preparava a sua licenciatura em letras, chegou a pensar que Deus o chamava ao sacerdócio mas entretanto adoeceu gravemente seu irmão Ernesto, de quem se tornou desvelado enfermeiro e a quem acompanhou ao Sul da França.
Tinha então à vista o espectáculo do desemprego, que afligiu o seu sensível coração e acabou por compreender que Deus o reservava para outra espécie de apostolado. Regressa ao Val-des-Bois, onde vai ajudar seu pai e casa então com sua prima Gabriela; tinha já vinte e quatro anos.
Logo a seguir adoece o pai que tem de deixar o Val com a mulher e Ernesto, sempre adoentado. E Léon Harmel vê-se, de repente, sozinho, com vinte e cinco anos; à testa da empresa!
A situação material do operário era, já então, bem melhor do que a maioria do operariado francês, porque o pai de Léon Harmel o tratava antes como associado de que como patrão; mas nos aspectos moral e religioso, tudo estava por fazer; os operários apreciavam a simplicidade de vida do patrão; notavam sem dúvida a sua grande piedade, mas não se deixavam influenciar por ela, de tal maneira que, entre 1 500 ou mais, apenas dois ou três assistiam à Missa ao Domingo!
Foi por esse lado que Léon Harmel quis começar; quando era preciso admitir pessoal, em vez de tomar ao serviço desconhecidos, procurava famílias cristãs, que fixava em Val-des-Bois, indo buscá-las principalmente a Sainte-Cécile, nas Ardennes belgas, cujos habitantes, de carácter temperado pelo clima rude, são susceptiveis de dar excelentes operários. Tal foi a matéria-prima com que povoou Val-des-Bois e que iria transfomar essa oficina em modelo dos centros fabris.
A morte da sua santa mãe lança-o ainda mais fortemente no campo do apostolado. Em 1863 cria a primeira associação religiosa, a dos Filhos de Maria; sucessivamente nascem: um orfanato, uma casa de família que dá alojamento e refeições; uma escola profissional de rapazes; um círculo para os homens, capaz de os fazer aprofundar as questões sociais à luz do Evangelho, armando-os contra as doutrinas revolucionárias; e, finalmente, a sonhada Capela dedicada a Nossa Senhora da Oficina com capelão permanente, onde irão fazer-se retiros trimestrais.
Estava realizada a oficina cristã, mas o esforço despendido fora excessivo e Léon Harmel é forçado a parar; empreende então com seu pai, também doente, a viagem a Roma, a qual restabeleceu a ambos e decidiu Léon Harmel a organizar peregrinações a Roma, que chegaram a contar 20 000 operários.
Admirável educador, sujeitou os filhos a disciplina quase militar, com um programa de vida sadia: alvorada às cinco horas, banho, oração, passeio, fosse qual fosse o tempo ou a estação e depois o dia escolar, do qual faziam parte exercícios de composição, aproveitados para incutir o horror à mentira, à desordem e a todos os vícios; três vezes por semana, visita aos operários doentes.
Apaixonado pela salvação das almas, fundou a "Associaçao Intima", de vítimas voluntárias pela conversão do mundo operário; para ela recrutava especialmente os doentes e a única obrigação dos seus membros consistia em recitarem diariamente uma oração em que ofereciam os sofrimentos pela conversão dos operários.
Oferecido assim como vítima voluntária, provou-o Deus com a perda da sua dedicadissima esposa, o que lhe arrancou estas palavras cristianíssimas:
"Meu Deus, quantas coisas aprendi nestes dias de tristeza! Tínhamos construído o nosso ninho na terra, como se nela sempre devêssemos ficar ... Deus soprou sobre estas moradas, que supúnhamos sólidas e aconteceu que a folha seca dos bosques não é mais leve: o paraíso voou! Que a vontade de Deus seja bendita! Vamos tentar reconstruir outra morada; mas desta vez Deus não só estará lá, mas estará só Ele: tudo o resto existirá nele e por Ele".
Foi também a hora dos desastres para a França e com eles as dificuldades para a indústria, pela queda do mercado francês e pela falta de transportes ferroviários. Mas Harmel confiava a Deus as dificuldades e chegado o momento da Comunhão, pedia-Lhe a resposta. Assim vivia ele em Cristo, e Cristo nele.
A sua actuação no campo social e religioso começou a dar nas vistas dos príncipes da Igreja e dos patrões cristãos, que convidaram o "Bom Pai", como lhe chamavam os seus operários, para fazer parte da União das Obras; Léon Harmel compareceu à chamada mas, com surpresa sua, quando pensava que iria escutar outros oradores, foi ele quem teve de descrever as suas realizações, o que fez por forma tal que passou a ser o imprescindível relator de teses nestes Congressos.
Conhece então e liga-se de amizade com Alberto de Mun, La Tour de Pin e Camilo Féron-Vrau.
.Mas quer fugir às discussões teóricas, "que levariam vinte anos a fazer o que os inimigos levam a cabo em três meses". Ao seu terno e delicioso amigo La Tour du Pin prega a acção e que se deixe de discussões bizantinas! E a Alberto de Mun, que em vão se agita na Câmara, grita: "Deixe essa galera, se não pode ser a voz das reivindicações da Igreja e da França para a protecção dos operários! Saía desse meio, que só pode fazer-lhe perder energia e carácter!".
Em Val-des-Bois ia nascendo uma doutrina social, da qual era mentor Léon Harmel que pretendia propagá-la, servindo-se principalmente do clero. Começou para isso a receber, no tempo de férias, a visita de sacerdotes e seminaristas que ali se fixavam uma temporada em agradável retiro, no qual se faziam reuniões, cuja alma era Harmel e das quais aqueles membros do clero saíam com uma sólida preparação para o exercício da acção social. Duraram estas reuniões catorze anos e foram as precursoras das "Semanas Sociais".
Léon Harmel pregava a doutrina, ao mesmo tempo que a aplicava. Em que consistia a corporação cristã de Val-des-Bois? A peça mestra era o Conselho da Oficina, órgão de cooperação dos operários com a direcção da fábrica, destinado a manter entre operários e patrões entendimento, baseado na confiança recíproca. O operariado elege os seus delegados que assistem às reuniões quinzenais do Conselho e dão a sua opinião sobre salários, disposições disciplinares, higiene, acidentes e aprendizagem; desta maneira tomam parte efectiva na direcção da fábrica.
No meio da família, Léon Harmel era o chefe muito amado por filhos, irmãos e sobrinhos. Em vida tão activa, soube conservar uma alegria santamente comunicativa, sempre à procura do bem que podia fazer, tanto aos seus como aos filhos dos operários, ou aos doentes que visitava. Aos próprios adversários considerava como amigos, e deles se vingava rezando terços por eles.
A piedade cresce nele com os anos, e assim é que agradece a Deus as insónias que lhe manda, por darem mais tempo para rezar. Obrigado a procurar clima mais macio, parte para Nice, onde frequenta a Capela dos Carmelitas e todo se regozija por estar ajoelhado a um metro de distância da Hóstia. "Que deliciosas conversas - diz ele. Então falo a Nosso Senhor de cada um de vós, nomeando-vos; tenho bom tempo para isso. Falo com o bom Senhor".
Mas em 14 de Novembro apanha um resfriado na Igreja de S. Bartolomeu. Declara-se uma pneumonia e, prevendo a morte, não deixa de gracejar.
"Tenham cuidado; quando morrer, não me metam no céu depressa demais; arriscar-se-iam a deixar-me no purgatório muitos anos!".
Em 19 desse mês, transportado ao oratório, chora, mas apressa-se a explicar à filha a razão das lágrimas: "Se choro, não é senão pelo que me custa deixar-te só, não mais ver o Val, os queridos que lá tenho e os meus amados operários. Mas, apesar de tudo, quero absolutamente a santa vontade de Deus. A ela me submeto inteiramente".
A 21 recebe a Extrema Unção com a maior calma: as forças começam a faltar e em 25, rezando a Nossa Senhora, entrega o seu belo espírito a Deus este grande cristão, que quis a regeneração das classes laboriosas pela fé cristã, e cuja grande força residiu no constante apoio que procurou na autoridade de Roma.
(transcrito do www.ssvp-portugal.org - Gilberto Custódio)
Cumprimentos Vicentinos de
António Fonseca
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