terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Mensagem da Quaresma, por BENTO XVI

Mensagem do Santo Padre para a Quaresma 2010


"A justiça de Deus manifestou-se pela fé em Jesus Cristo"

Autor: S.S. Bento XVI | Fuente: Vatican Information Service

Publicou-se hoje a Mensagem de Bento XVI para a Quaresma 2010. O texto, datado de 30 de Outubro de 2009, leva por título a seguinte afirmação de São Paulo em sua Carta aos Romanos: ""A justiça de Deus manifestou-se pela fé em Jesus Cristo". Segue o documento íntegro em sua versão espanhola (traduzido para português, por A. Fonseca):
"Cada ano, por ocasião da Quaresma, a Igreja convida-nos a uma sincera revisão de nossa vida à luz dos ensinamentos evangélicos. Este ano quero propor-vos algumas reflexões sobre o vasto tema da justiça, partindo da afirmação paulina: A justiça de Deus manifestou-se pela fé em Jesus Cristo (cf. Rm 3,21-22).
Detenho-me, em primeiro lugar, no significado da palavra "justiça", que na linguagem comum implica "dar a cada um o seu" - "dare cuique suum", segundo a famosa expressão de Ulpiano, um jurista romano do século III. Sem embargo, esta clássica definição não clarifica na realidade em que consiste "o seu" que há que assegurar a cada um. Aquilo de que o homem tem mais necessidade não se lhe pode garantir por lei. Para gozar de uma existência em plenitude, necessita algo mais íntimo que se lhe pode conceder só gratuitamente: poderíamos dizer que o homem vive do amor que só Deus, que o criou à sua imagem e semelhança, pode comunicar-lhe. Os bens materiais certamente são úteis e necessários (é mais, Jesus mesmo se preocupou de curar aos enfermos, de dar de comer à multidão que o seguia e sem dúvida condena a indiferença que também hoje provoca a morte de centenas de milhões de seres humanos por falta de alimentos, de água e de medicinas), mas a justiça "distributiva" não proporciona ao ser humano todo "o seu" que lhe corresponde. Este, além do pão e mais que o pão, necessita de Deus. Observa santo Agostinho: se "a justiça é a virtude que distribui a cada um o seu… não é justiça humana a que separa o homem do verdadeiro Deus" (De Civitate Dei, XIX, 21).
"O evangelista Marcos refere as seguintes palavras de Jesus, que se situam no debate daquele tempo sobre o que é puro e o que é impuro: "Nada há fora do homem que, entrando nele, possa contaminá-lo; mas sim o que sai do homem, isso é o que contamina ao homem… O que sai do homem, isso é o que contamina ao homem. Porque de dentro, do coração dos homens, saem as más intenções" (Mc 7,15. 20-21). Mais além da questão imediata relativa aos alimentos, podemos ver na reacção dos fariseus uma tentação permanente do homem: a de identificar a origem do mal numa causa exterior. Muitas das ideologias modernas têm, se nos fixamos bem, este pressuposto: dado que a injustiça vem "de fora", para que reine a justiça é suficiente eliminar as causas exteriores que impedem ser posta em prática. Esta maneira de pensar - adverte Jesús - é ingénua e míope. A injustiça, fruto do mal, não tem raízes exclusivamente externas; tem sua origem no coração humano, onde se encontra o germe de uma misteriosa convivência com o mal. O reconhece amargamente o salmista: "Repara, na culpa nasci, pecador me concebeu minha mãe" (Sal 51,7). Sim, o homem é frágil por causa de um impulso profundo, que o mortifica na capacidade de entrar em comunhão com o próximo. Aberto por natureza ao livre fluxo de compartilhar, sente dentro de si uma estranha força de gravidade que o leva a reprimir-se em si próprio, a impor-se acima dos outros e contra eles: é o egoísmo, consequência da culpa original. Adão e Eva, seduzidos pela mentira de Satanás, aferrando o misterioso fruto contra do mandamento divino, substituíram a lógica de confiar no Amor pela da suspeita e a competição; a lógica de receber, de esperar confiado os dons do Outro, pela lógica ansiosa de aferrar e de actuar por sua conta (cf. Gn 3,1-6), experimentando como resultado um sentimento de inquietação e de incerteza. ¿Como pode o homem livrar-se deste impulso egoísta e abrir-se ao amor? 
No coração da sabedoria de Israel encontramos um vínculo profundo entre a fé em Deus que "levanta do pó ao desvalido" (Sal 113,7) e a justiça para com o próximo. O expressa bem a própria palavra que em hebreu indica a virtude da justiça: sedaqad,. Com efeito, sedaqad significa, por um lado, aceitação plena da vontade do Deus de Israel; por outro, equidade com o próximo (cf. Ex 20,12-17), em especial com o pobre, o forasteiro, o órfão e a viúva (cf. Dt 10,18-19). Mas os dois significados estão relacionados, porque dar ao pobre, para o israelita, não é outra coisa que dar a Deus, que se apiedou da miséria de seu povo, o que lhe deve. Não é por acaso que o dom das tábuas da Lei a Moisés, no monte Sinai, suceda depois da passagem do Mar Vermelho. Quer dizer, escutar a Lei pressupõe a fé em Deus que foi o primeiro a "escutar o clamor" de seu povo e "desceu para o livrar da mão dos egípcios" (cf. Ex 3,8). Deus está atento ao grito do desdenhado e como resposta pede que o escutemos: pede justiça com o pobre (cf. Si 4,4-5.8-9), o forasteiro (cf. Ex 20,22), o escravo (cf. Dt 15,12-18). Portanto, para entrar na justiça é necessário sair dessa ilusão de auto-suficiência, del profundo estado de encerramento, que é a origem de nossa injustiça. Em outras palavras, é necessário um "êxodo" mais profundo que o que Deus obrou com Moisés, uma libertação do coração, que a palavra da Lei, por si só, não tem o poder de realizar. ¿Existe, pois, esperança de justiça para o homem? 
O anúncio cristão responde positivamente à sede de justiça do homem, como afirma o Apóstolo Paulo na Carta os Romanos: "Agora, independentemente da lei, a justiça de Deus se há manifestado… pela fé em Jesus Cristo, para todos os que crêem, pois não há diferença alguma; todos pecaram e estão privados da glória de Deus, e são justificados pelo dom de sua graça, em virtude da redenção realizada em Cristo Jesus, a quem exibiu Deus como instrumento de propiciação por seu próprio sangue, mediante a fé, para mostrar sua justiça (Rm 3,21-25).
¿Qual é, pois, a justiça de Cristo? É, antes de tudo, a justiça que vem da graça, onde não é o homem que repara, se cura a si mesmo e aos outros. O facto de que a "propiciação" tenha lugar no "sangue" de Jesus significa que não são os sacrifícios do homem os que o livram do peso das culpas, mas sim o gesto do amor de Deus que se abre até ao extremo, até aceitar em si próprio a "maldição" que corresponde ao homem, a fim de lhe transmitir em troca a "bênção" que corresponde a Deus (cf. Ga 3,13-14). Mas isto suscita em seguida uma objecção: ¿que justiça existe onde o justo morre em lugar do culpável e o culpável recebe em troca a bênção que corresponde ao justo? Cada um não recebe deste modo o contrário de "o seu"? Em realidade, aqui se manifesta a justiça divina, profundamente distinta da humana. Deus pagou por nós em seu Filho o preço do resgate, um preço verdadeiramente exorbitante. Frente à justiça da Cruz, o homem pode-se rebelar, porque põe de manifesto que o homem não é um ser autárquico, mas que necessita de Outro para ser plenamente ele próprio. Converter-se a Cristo, crer no Evangelho, significa precisamente isto: sair da ilusão da auto-suficiência para descobrir e aceitar a própria indigência, indigência dos outros e de Deus, exigência de seu perdão e de sua amizade.
Se entende, então, como a fé não é um facto natural, cómodo, óbvio: faz falta humildade para aceitar ter necessidade de Outro que me liberte do "meu", para me dar gratuitamente o "seu". Isto sucede especialmente nos sacramentos da Penitência e da Eucaristia. Graças à acção de Cristo, nós podemos entrar na justiça "maior", que é a do amor (cf. Rm 13,8-10), a justiça de quem em qualquer caso se sente sempre mais devedor do que credor, porque recebeu mais do que podia esperar.
Precisamente pela força desta experiência, o cristão se vê impulsionado a contribuir para a formação de sociedades justas, onde todos recebam o necessário para viver segundo sua própria dignidade de homens e onde a justiça seja vivificada pelo amor.
Queridos Irmãos e Irmãs, a Quaresma culmina no Tríduo Pascal, em que este ano voltaremos a celebrar a justiça divina, que é plenitude de caridade, de dom e de salvação. Que este tempo penitencial seja para todos os cristãos um tempo de autêntica conversão e de intenso conhecimento do mistério de Cristo, que veio para cumprir toda justiça. Com estes sentimentos, vos envio a todos, de coração, a bênção apostólica".

Recolha e transcrição de e-mail recebido de

http://es.catholic.net em 8 de Fevereiro de 2010

e traduzida de espanhol para português

por António Fonseca

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