sábado, 14 de março de 2009

ANO PAULINO - Leitura Nº 43

43

“TENDO RENUNCIADO À IMPIEDADE E AOS DESEJOS MUNDANOS, VIVAMOS DE MODO PRUDENTE, JUSTO E PIEDOSO

Há cristãos que, pela sua idade, responsabilidades ou outras circunstâncias, precisam de uma especial atenção, designadamente a nível das orientações morais. Pode ser o caso das pessoas idosas, dos jovens, das esposas e mães.

É para esses grupos que Paulo escreve em Tt 2, 1-15, juntando ainda os escravos, então muito numerosos. Não se dirige, porém, directamente a essas pessoas, mas a Tito, seu antigo colaborador e agora responsável por uma comunidade cristã. Paulo comunica-lhe o que ele, por sua vez, deve ensinar na sua comunidade. Com isto, as suas palavras adquirem um cunho eclesial próprio: contribuem para a construção da Igreja, uma vez que os destinatários são tratados como seus membros.

Esta eclesial idade é tanto mais de assinalar, quanto Paulo adopta as chamadas tabelas domésticas, documentadas por outros escritos de então. Eram um conjunto de regras destinadas aos diversos e, em muitos casos, numerosos membros dos agregados familiares, em ordem ao bom funcionamento destes. Em parte, são assumidas no NT (C1 3, 18-4, 1; Ef 5, 21-6,9; 1 Pd 2, 13-3.7), onde recebem, acima de tudo, uma fundamentação cristã. Com a marca eclesial, específica de Tt 2, 1-15, o nosso comportamento cristão é integrado na missão da Igreja, nomeadamente para com a família e a sociedade.

Tt 2, 1-15

Tu, porém, fala do que é conforme a sã doutrina:

Os anciãos sejam sóbrios, dignos, prudentes, firmes na fé, na caridade, na paciência. Do mesmo modo, as anciãs tenham um comportamento reverente, não sejam caluniadoras nem escravas de muito vinho, mas mestras do que é bom, a fim de orientarem as jovens a amarem os maridos, a amarem os filhos, a serem prudentes, castas, boas donas de casa, subordinadas aos maridos, a fim de que a Palavra de Deus não seja difamada.

Exorta do mesmo modo os jovens a serem prudentes em tudo, apresentando-te a ti próprio como modelo de boas obras; no ensino, mostra integridade, dignidade, uma palavra sã, irrepreensível, para que o adversário fique envergonhado, por não ter nada de mal a dizer de nós.

Os escravos sejam subordinados aos seus próprios senhores em tudo, sejam-lhes agradáveis, não os contradigam, não os defraudem, mas mostrem-lhes toda a devida lealdade, a fim de honrarem a doutrina de Deus nosso Salvador em tudo.

Com efeito, manifestou-se a graça de Deus, portadora de salvação para todos os homens, ensinando-nos que, tendo renunciado à impiedade e aos desejos mundanos, vivamos de modo prudente, justo, piedoso, no século presente, aguardando a bem-aventurada esperança e a gloriosa manifestação do nosso grande Deus e Salvador Jesus Cristo, que se entregou por nós, a fim de nos resgatar de toda a iniquidade e de purificar para si um povo da sua exclusiva posse e zeloso na prática das boas obras.

Fala destas coisas, exorta e repreende com toda a autoridade. Que

ninguém te despreze.

É sã a doutrina a transmitir, na medida em que, isenta de desvios susceptíveis de corromper a sua originária e íntegra ligação a Cristo e ao Apóstolo (1, 6-10), contribui para a saúde dos seus destinatários, a quatro níveis:

1. É saudável para os próprios, individual e, sobretudo, socialmente. Já então, os anciãos eram apreciados pela sua sobriedade, dignidade e prudência (v. 2). E as anciãs, pelo respeito que angariavam, evitando, por exemplo, calúnias e excessos de álcool, eram um incentivo à prática do bem (v. 3), mormente para as jovens esposas e mães, levando-as a amar os maridos e filhos, na prudência, fidelidade matrimonial, arranjo da casa, subordinação aos maridos (v. 5). Aos jovens, devido à sua imaturidade, é compreensível que se pedisse, primariamente, prudência (v. 6). Dos escravos esperava-se uma subordinação que os tornasse agradáveis aos seus senhores e se concretizava na lealdade e no respeito pelas suas ordens e seus bens (vv. 9s).

É claro que, deste modo, a Igreja contribuía para a necessária ordem social então apoiada na estrutura familiar. Mas a que custos? Será saudável exigir a total subordinação das esposas e dos escravos, sem, ao menos, as contrapartidas da parte dos maridos e senhores, exigidas em C1 3, 18-4,1 ? Onde está a igual dignidade de todos os cristãos, proclamada em G1 3, 28; 1 Cor 12, 13 e C1 3, 11?

2. É saudável para a Igreja nas situação em que se encontra nos finais do séc. I, isto é, a debater-se com heresias que ameaçam a sua identidade e unidade. E, sem esta, que credibilidade pode ter o Evangelho que anuncia? A fim de que a Palavra de Deus não seja difamada ou a fim de honrarem a doutrina de Deus nosso Salvador, por isso é que às esposas e aos escravos é pedida subordinação (vv. 5, 10). Além disso, o silêncio em relação aos maridos e aos senhores, é na fé, na caridade e na paciência que se manifesta a sua conduta cristã. Por isso, esta conduta:

3. É saudável para a própria sã doutrina, exposta nos vv. 11-14, como manifestação da graça de Deus, portadora de salvação para todos os homens (v. 11). Cronologicamente, esta manifestação começou com a entrega de Cristo por nós, a fim de nos resgatar de toda a iniquidade e de purificar para si um povo da sua exclusiva posse (v. 14). Este acontecimento, fundador da Igreja e anunciado no Evangelho, levou por sua vez, os que nele crêem a renunciar, no Baptismo, à impiedade e aos desejos mundanos (v. 12). Uma renúncia que se prolonga por toda a sua vida, se for vivida de modo prudente, justo, piedoso, no século presente (v. 12) e na prática das boas obras (v. 14). Um, comportamento que é sinal e garantia da definitiva já que nele, aguardamos a bem-aventurada esperança e a gloriosa manifestação do nosso grande Deus e Salvador Jesus Cristo (v. 13).

Repare-se como a nossa conduta moral faz parte deste processo salvífico. E se este se deve à graça de Deus então o específico do nosso procedimento é a gratuidade, que é ilimitada, tanto no bem, que praticamos como nas pessoas a quem o fazemos.

4. É saudável para o responsável pela vida das comunidades cristãs, ao qual, para isso, foi concedida a autoridade de comunicar a doutrina cristã, der exortar a pô-la em prática e de corrigir os que dela se desviam (v. 14). A eficácia da sua missão depende, porém, do modo como o faz: se no ensino mostra integridade, dignidade, se é realmente modelo de boas obras (v. 7s). Haverá então alguém que o despreze (v. 15)? Quando muito, quem, mesmo assim, teimar em rejeitar a sã doutrina.

13-03-2009

Do Livro

UM ANO A CAMINHAR COM SÃO PAULO

da autoria de

D. Anacleto de Oliveira - Bispo Auxiliar de Lisboa

António Fonseca

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