in: voz-portucalense-17.6.2009
[ Especial ]
A Igreja não pode alhear-se dos problemas sócio-caritativos
Alexandrino Brochado
Disse Jacques Leclercq: "Ser homem e ser insatisfeito são sinónimos". É realmente assim. No mundo que nos rodeia há muita fome e muita sede. Da água da cisterna ou da água da fonte, em sentido real e físico, porque em muitas zonas do globo se estagna ou morre à míngua de água. Há anos, numa conferência que ouvi a um cardeal, de cor, ele afirmava: "Daqui por alguns anos, a falta de água vai ser o problema que mais vai afligir a humanidade". Mas também e primordialmente de água metafórica ou espiritual. E daí, a sede de justiça, de amor, de liberdade, de paz, de infinito, de imortalidade, consciente ou inconscientemente, sede de Deus. Mais concretamente e ao nosso lado, ouvem-se murmúrios e clamores por causa de situações, antiga e nova pobreza, dolorosamente sentidas e devidamente diagnosticadas; há fenómenos de marginalização crescente de jovens e idosos, carências graves de habitação, assistência e emprego, o escândalo dos salários em atraso; as chagas sociais do alcoolismo, da prostituição e da droga. Os que de tudo isto são vítimas, tantas vezes em processos inconscientes de fuga, de protesto e alienação, têm sede de libertação e de esperança que alguém deles se abeire para se erguerem da sua miséria e encetarem o caminho da recuperação. Quantos não se terão interrogado, conduzidos por uma réstia de fé: "O Senhor está ou não está no meio de nós?" Não há um ateísmo de protesto, originado nas injustiças, nos desequilíbrios sociais, nas desumanidades deste nosso mundo que ainda se quer maioritariamente cristão? Não há um anticlericalismo de reacção pelo excesso de poder, por perda de vitalidade da Igreja, pela falta de compromisso dos cristãos nas tarefas temporais, pela sua falta de empenhamento na satisfação de anseios básicos de largas faixas da população, tantas vezes sujeitas a estruturas de pressão, geradoras de injustiças crescentes? Entre as tarefas da Igreja a evangelização ocupa o primeiro lugar. Em Portugal, os nossos Bispos elegeram a Pastoral da Fé como opção prioritária nestes próximos anos. Se é certo que a Pastoral da Fé ocupa o primeiro lugar, na doutrina da Igreja, não é menos certo que os problemas sociais e caritativos não podem ser obliterados no espírito e na acção de todos aqueles que professam a doutrina de Cristo. A caridade ou o amor é e será sempre o leit-motiv de toda a evangelização da Igreja. Não arredemos as preocupações sociais e caritativas dos caminhos da Igreja. Ela está lá por direito próprio e missão evangélica.
Por considerar, pessoalmente, que este tema abrange a Conferência Vicentina de S. Paulo (de que sou responsável) resolvi transcrever este texto da edição da Voz Portucalense, de 17 de Junho, com a devida vénia.
António Fonseca
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